Os Deuses e as rochas

Escrito por António Costa

Alguns povos antigos viam nas formas das rochas a obra dos deuses. Estrias poligonais, torres perfeitas, cores uniformes e outras surpreendentes figuras naturais eram tão bonitas, e às vezes tão perfeitas, que não pareciam obra da natureza, mas sim de poderes “superiores”.
A formação das 40 mil colunas basálticas (colunas prismáticas de material vulcânico), denominada de Calçada dos Gigantes, na Irlanda do Norte (na foto), é uma destas formas que incentivaram a imaginação dos homens. Trata-se de uma verdadeira maravilha da natureza que inspirou, no ser humano, a ideia do divino. Conta a lenda que dois gigantes estavam em confronto e viviam um na Irlanda e o outro na Escócia. Um deles construiu uma ponte com as rochas existentes no local para enfrentar o seu arqui-inimigo, mas a mulher do gigante ameaçado disfarçou-o de bebé. Por prudência (se o bebé era desse tamanho, o pai deverá ter pelo menos o triplo), o primeiro decidiu voltar para trás, destruindo a calçada que tinha construído. A formação destas estruturas remonta há mais de 60 milhões de anos, quando a América e a Europa começavam a distanciar-se, provocando uma fratura entre o oeste da Escócia e o nordeste da Irlanda. O movimento de placas gerou uma erupção vulcânica cuja lava arrefeceu lentamente, formando poliedros iguais justapostos.
A Torre do Diabo, no Wyoming (Estados Unidos), possui também a sua lenda. Para os índios kiowas e dakotas da zona, o verdadeiro nome da torre é “A Casa de Campos de Ursos”. Dizem que a forma de estrias verticais da torre foi provocada pelos arranhões de um urso gigante. A estrutura emergiu na mesma época da Calçada dos Gigantes com a sua forma atual e as estrias poligonais foram modeladas pela erosão durante milhões de anos.
A epopeia de Gilgamesh é outro exemplo de como os antigos incorporaram eventos naturais nos seus mitos para explicar a Terra e os seus mistérios. A narrativa das aventuras de Gilgamesh foi registada em placas de argila e escrita cuneiforme, de origem babilónica, que foram encontradas em Nippur, perto da atual Bagdade (Iraque). É considerada a referência escrita mais antiga da história. Um dos relatos é o do grande dilúvio, ao qual escapou um escolhido pelos deuses, antecedente claro da história da Arca de Noé, que aparece na Bíblia.
Na Grécia e na Roma antigas muito dos deuses eram identificados com processo geológicos, caso das erupções vulcânicas da Sicília, atribuídas ao deus Vulcano.
O Bosque de Pedras de Huayllay, em Pasco (Peru), é outra das maravilhas geológicas que alimentou mitos. Foram escritos milhares de relatos sobre este lugar que inspira pensamentos fantásticos. Ali, a mais de 4.300 metros de altitude, existem mais de 4.000 formações rochosas, com figuras humanas e animais, como aves, elefantes ou tartarugas. As “wankas”, ou pedras paradas, estão sempre nos relatos sobre a petrificação de heróis e também como pedras que se animam e ceifam vidas.

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António Costa

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