Onde vais tu, pequenito?

Dizem os entendidos que o assunto mais relevante na campanha eleitoral que parece estar a acontecer é a imigração. Às vezes também referem a emigração. Durante os tempos da pandemia, a principal preocupação eram as deslocações das pessoas ao estrangeiro ou a casa da avó. Os políticos e os pretendentes a tal aparentam nutrir hoje em dia uma obsessão pelos sítios onde as pessoas vão, seja para passear, seja para viver.
Curiosamente, os grupúsculos activistas, como na popular anedota, também distinguem turismo e imigração. A mesma turba ululante que se manifesta a favor da chegada livre de barcos com imigrantes ataca autocarros que trazem turistas (não é graçola, aconteceu em Barcelona). Pessoalmente, discordo desta discrepância. Colectivamente, o povo é que sabe. A não ser quando o povo não pensa como eu. Nesse caso, o povo é parvo.
Imigrantes, emigrantes e turistas, que venham e que vão, e que fiquem e que voltem, e que façam o que lhes der na real gana. Que tragam outro amigo também, que tragam especiarias da Índia e da Geórgia, que levem tremoços e alheiras, que celebrem o Ramadão em Braga e o Natal em Bagdad. Que usem missangas e quipás. Principalmente, que me deixem em paz.
Portugal é um sítio onde ser nacionalista e neonativista é simultaneamente trágico e divertido. Os nossos antepassados são uma mistura de restos de Neanderthal com fenícios, celtas, romanos, berberes, godos, suevos, judeus e malta que veio ver o mar. O país foi fundado por um tipo que era filho de dois estrangeiros. A música do hino nacional foi composta por outro tipo que era filho de dois estrangeiros. Houve reis espanhóis. Houve um rei que preferiu ficar com o Brasil e dar isto à filha. As grandes tradições da cultura portuguesa são um peixe pescado na Noruega e uma forma de cantar vinda do Norte de África. Se calhar é esta a missão universal do Quinto Império de que nos falava Padre António Vieira. Não é Portugal andar a espalhar-se pelo mundo, mas o mundo inteiro vir espalhar-se a Portugal.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

Sobre o autor

Nuno Amaral Jerónimo

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