A Francisco Pinto Balsemão

Sugiro a instalação na Guarda de um centro de estudos Francisco Balsemão, Cidadão Honorário da cidade, onde todos possamos conhecer melhor a sua origem, a sua vida e o seu legado.

Conheci Francisco Balsemão há mais de 25 anos. Tive o privilégio de poder colaborar com ele no “Expresso”, esse jornal essencial na democracia portuguesa. Com ele, e com José António Saraiva, Henrique Monteiro, José António Lima, Afonso Camões e tantos outros, criámos a “Rede Expresso” com os melhores jornais regionais do país. O projeto era de todos e os conteúdos foram produzidos por todos, mas a génese, o conceito e a ideia era de Francisco Balsemão. Mais, esteve sempre presente nas reuniões preparatórias, no acompanhamento da formação, na organização dos conteúdos e na definição dos objetivos. A sua presença era imprescindível pelo ânimo, pelo conhecimento e os ensinamentos.

Num jornal não se faz jornalismo para ganhar dinheiro, ganha-se dinheiro para fazer jornalismo, como recordou Pedro Santos Guerreiro, escrevendo sobre os ensinamentos do fundador do “Expresso”. Um jornal presta um serviço, em primeiro lugar, aos seus leitores, mas também a toda a comunidade. E quando não é assim, um jornal não serve para nada. A força de um jornal assenta nos seus leitores, nos seus seguidores, nos que confiam na sua informação, no que publica, divulga e comenta. Mas um jornal não pode ficar refém de vontades, interesses, amizades ou influências. Um jornal tem de ser livre. Mas para ser livre tem de ganhar dinheiro para fazer jornalismo…

Foi também assim que Francisco Balsemão nos ensinou o que era a liberdade de imprensa. E, repetidamente, dizia que sem liberdade de imprensa, não há liberdade de expressão, não há liberdade de opinião, não há democracia…

«Aspiramos, coerentemente, a contribuir para que se alcance em Portugal a liberdade de informação: liberdade de informar; liberdade de ser informado, escrevia Francisco Balsemão, a 6 de janeiro de 1973, no principal editorial do primeiro número do “Expresso”, o semanário que acabara de fundar e de que era o principal proprietário.

Francisco Balsemão foi o maior jornalista do nosso tempo, foi jornalista pela capacidade de noticiar, de perceber a importância da comunicação social, a gestão dos contextos e pela forma como promoveu cada uma das plataformas que utilizou (e desenvolveu). Homem culto, inspirador e visionário, ele foi o melhor de nós.

Foi fundador do PSD, do “Expresso”, da SIC, foi primeiro-ministro, sempre jornalista, morreu terça-feira aos 88 anos. E com ele morreu o tempo dos que podiam fazer dinheiro a fazer jornais. E morreu a noção de que mesmo sem dinheiro é possível defender a liberdade de imprensa, como ele defendia. Por isso, em jeito de homenagem, ouvimos por estes dias tantos jornalistas dizerem que Balsemão significava Liberdade, Curiosidade, Desafio, Jornalismo.

Nasceu em Lisboa e vivia como um lisboeta, mas era orgulhosamente filho da Guarda, de que foi deputado à Assembleia Nacional, entre 1969 e 1973, eleito pela União Nacional (partido único) de que se viria a afastar para liderar com Sá Carneiro a “Ala Liberal”, um grupo dissidente – em 1969 calcorreou as aldeias e vilas do distrito da Guarda em campanha eleitoral.

Em março de 2023, em boa hora, a Câmara da Guarda outorgou-lhe a Medalha de Honra, Grau Ouro, do município, e declarou Pinto Balsemão Cidadão Honorário da Cidade. Ele foi figura central do Portugal democrático e o país não vai esquecê-lo e a Guarda deve orgulhosamente promover a sua elevação enquanto Cidadão Honorário – sugiro a instalação na cidade da Guarda de um centro de estudos da vida e obra de Francisco Pinto Balsemão, onde todos possamos conhecer melhor a sua origem, a sua vida e o seu legado.

Na despedida, nos Jerónimos, Camané cantou “Abandono”, de David Mourão-Ferreira, um dos poemas de Francisco Balsemão e representativo de uma vida dedicada ao jornalismo, à liberdade e à liberdade de imprensa: «Por teu livre pensamento/foram-te longe encerrar./Tão longe que o meu lamento/não te consegue alcançar./E apenas ouves o vento./E apenas ouves o mar./Levaram-te, era já noite:/a treva tudo cobria./Foi de noite, numa noite/de todas a mais sombria./Foi de noite, foi de noite,/e nunca mais se fez dia./Ai dessa noite o veneno/persiste em me envenenar./Ouço apenas o silêncio/que ficou em teu lugar./Ao menos ouves o vento!/Ao menos ouves o mar!» – poema que também ficou conhecido por “Fado de Peniche”.

Como ele dizia sobre si mesmo, Francisco Pinto Balsemão tem direito a muito mais do uma nota de rodapé na história de Portugal. Ele foi um protagonista singular da história de Portugal.

<Destaque> Sugiro a instalação na Guarda de um centro de estudos Francisco Balsemão, Cidadão Honorário da cidade, onde todos possamos conhecer melhor a sua origem, a sua vida e o seu legado.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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