“Si hay poder soy contra”

”Si Hay Gobierno? Soy contra!” Esta famosa frase de cariz anarquista, com suposta origem no México, é uma das frases mais badaladas por muitos e supostos espíritos livres e utópicos. A origem desta máxima estará na historieta anedótica do anarquista vítima de naufrágio que, ao chegar à praia de um país desconhecido, logo proclama perante os seus acolhedores habitantes: «Obrigado por me salvarem! Mas se há Governo, sou contra!».
Na imprensa, esta máxima continua a fazer todo o sentido. Não na dimensão anedótica, ou sequer anarquista e utópica. Antes no sentido vigilante, democrático e escrutinador. Os jornais são, por princípio, contrapoder. Não porque tenham de ser contra o poder, mas porque têm a missão de informar de forma equidistante dos poderes; têm de interrogar e escrutinar os governos; têm de revelar o que está para além do dizível, de contribuir para uma sociedade mais informada, de divulgar o que muitas vezes é escondido do cidadão, de partilhar com todos o que só alguns sabem, de publicar o contrário às vontades de quem domina, de dar voz aos mais fracos e de promover a liberdade e a liberdade de expressão. Nos jornais é assim! Tem de ser assim! Como escreveu Baptista-Bastos: «Não há jornalismo neutro, porque o jornalismo é, sempre e sempre, a oposição do direito e do facto contra os inimigos da liberdade de dizer».
Álvaro Amaro foi presidente da Câmara da Guarda desde 2013 até junho de 2019. Foi o líder do concelho onde este jornal tem sede. E foram seis anos de relação difícil entre o autarca e O INTERIOR – em que procurámos cumprir com a nossa obrigação de informar com rigor e seriedade. E em que, tal como nos períodos anteriores, muitas vezes informámos e publicámos opinião divergente das vontades do poder instituído. Se com Maria do Carmo Borges, Joaquim Valente e Vergílio Bento, este jornal foi quase sempre “riscado” das relações institucionais e prejudicado gravemente na distribuição de publicidade e nas relações comerciais (que praticamente não existiram) com prejuízos económicos e financeiros graves para o jornal, o mesmo se passaria nos seis anos de mandato de Álvaro Amaro. No período em que porventura a Câmara da Guarda mais investiu em propaganda e publicidade, promovendo os mais diversos eventos em toda a comunicação social local, regional e nacional, O INTERIOR foi quase sempre excluído de forma grosseira, antidemocrática e penalizadora. Milhares de euros perdidos por não nos vergarmos perante as vontades do poder, que chegou a emitir comunicados contra a linha editorial deste jornal e com ataques vis ao exercício da sua atividade, não porque a informação publicada fosse falsa, mas porque era verdadeira e a opinião era contrária às vontades e ao ego de quem governava. Os prejuízos financeiros causados à empresa editora deste jornal, durante estes anos em que praticámos a liberdade de expressão, foram muitos. Como o tinham sido antes, durante os anos em que o PS governou a Guarda e o jornal O INTERIOR foi quase sempre excluído.
Esta semana publicamos a primeira entrevista de Álvaro Amaro depois de abandonar a presidência da Câmara da Guarda. Uma entrevista sobre o atual PSD e sobre a perspetiva da atualidade política de um dos mais experientes políticos portugueses no ativo. Uma entrevista com um antigo colaborador do jornal, que leva 35 anos na política, que esteve no poder central e local, que durante seis anos não aceitou que este jornal o criticasse. Uma entrevista onde poderíamos ter feito muitas outras perguntas, em que poderíamos aprofundar diferenças do passado ou focar-nos pragmaticamente no poder local ou até aproveitarmos para achincalhar o entrevistado, mas não, uma entrevista onde, como é obrigação de um jornal, quisemos saber o que pensa um protagonista da região sobre o presente e o futuro. Porque somos contrapoder e escrutinamos. Mas não ficamos reféns de diferenças pessoais ou egos exacerbados. Como escreveu um dia António Paulouro no “Jornal do Fundão”, «claramente alinhamos ao lado dos que se não resignam e tudo sacrificam, sem mágoa, aos superiores interesses do engrandecimento do concelho» e da região.

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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