Cara a Cara

«Fazer o melhor vinho não chega. O enoturismo significa já, nalgumas empresas, um terço da faturação»

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Escrito por ointerior

P – O Beyra Grande Reserva 2022 foi considerado o melhor vinho da Beira Interior. Qual o segredo para esta distinção e como olha para este prémio?
R – Não vejo estes prémios como um passatempo. Sou das poucas empresas que vive do vinho. Diria mesmo que 90 por cento das empresas da Beira Interior fazem vinho por uma questão de herança sentimental e emocional. Penso que tem de haver um caráter empreendedor em tudo aquilo que fazemos, como é o meu caso. Este prémio traz ainda maior responsabilidade e empenho no trabalho que desenvolvo.

P – Qual o cenário atual do setor vitivinícola em termos económicos e financeiros?
R – Em termos de sustentabilidade, há a sustentabilidade ambiental que é fácil de contornar, a sustentabilidade social, mas, fundamentalmente, há uma sustentabilidade em termos de “governance”. E, numa empresa como a minha, as coisas são difíceis. Imaginemos aquilo que se passa com um simples produtor de uva! Eu, se fosse apenas produtor de uva, declarava falência.

P – Quer deixar um exemplo do que está na base dessa dificuldade?
R – Por exemplo, a Síria é a tal casta que faz eco na Beira Interior e que é sinónimo do vinho branco mais barato de Portugal. Acho que fazer vinho a partir de Síria é o caminho errado. Além disso, os vinhos biológicos feitos na Beira Interior também são os mais baratos. Não podemos continuar a ser o parente pobre. Devemos concertar-nos em fazer vinhos com alto valor acrescentado.

P – Mas, há alguma receita que possa ultrapassar estes obstáculos?
R – Eu acredito no futuro e tenho uma equipa a trabalhar, mas penso que há muita gente que não vai conseguir levar por diante os seus projetos. O futuro vitivinícola desta região passa por juntar os vinhos ao turismo. Os vinhos não funcionam sem enoturismo. O enoturismo significa já, nalgumas empresas, um terço da faturação. O facto de termos o melhor vinho não chega.

P – Esta região vitivinícola tem ou não futuro assegurado?
R – A oportunidade que temos é a melhor que existe em Portugal. Em nenhuma CVR acontece o que que está a acontecer na Beira Interior. Como ainda não somos conhecidos como outras regiões vitivinícolas, somos tratados marginalmente e isso acho que é uma oportunidade para iniciarmos um caminho diferente. As outras CVR estão quase todas a morrer e dou como exemplo o vinho do Porto, que é uma coisa que está defunta. Como a CVRBI quase não tem passado, isso pode ser uma vantagem para pensarmos no melhor caminho para o futuro. Há que trabalhar imenso porque isto começou agora.

P – Recorde-me como nasceu a empresa Rui Roboredo Madeira?
R – Desde o séc. XIX que a minha família se encontra ligada à lavoura e à viticultura na zona raiana entre o Douro Superior e a Beira Alta, numa das zonas mais remotas da Península Ibérica. Foi em família que nasceu a minha paixão pelos aromas e cheiros desta terra que nos moldam o caráter. É um legado de respeito pela fauna e flora tradicionais da região, pelo meio ambiente e as suas gentes.

 

Entrevista a Rui Roboredo Madeira, Vencedor do 18º Concurso de Vinhos da Beira Interior

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