Região

«A Feira de São Bartolomeu é a mais antiga feira franca de Portugal e continua a ser de grande importância para Trancoso»

Escrito por Jornal O Interior

Amílcar Salvador, presidente da Câmara Municipal de Trancoso

P – O que nos reserva Feira de São Bartolomeu de 2019?
R – A Feira de São Bartolomeu é tão só a feira franca mais antiga do país, foi criada em 1273 por D. Afonso III, e é de facto um grande evento para Trancoso. Atrai milhares de visitantes e é uma montra excecional para divulgar e promover aquilo que de bom se faz no concelho e na região. Temos um espaço agradável, com cerca de 32 mil metros quadrados, além do pavilhão multiusos que está reservado para as atividades económicas. Temos as diversões, as tasquinhas, o artesanato, os automóveis, a maquinaria agrícola e, claro, um excelente cartaz de espetáculos com grandes nomes da música portuguesa. Este ano, no pavilhão multiusos, também iremos dar um grande destaque às sardinhas doces – que terão reservada uma área específica de promoção com stands e produtores. Contamos ter também espaços do Turismo do Centro, da Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela, das Aldeias Históricas e, eventualmente, da Rede de Judiarias de Portugal. Temos sempre uma grande dificuldade em termos de espaço no pavilhão e no recinto da feira. O certame de 2019 vai seguir o figurino do ano anterior, que tem resultado muito bem, com uma vedação transparente, um palco enorme e uma tenda para amenizar as noites menos quentes.

P – Quantos expositores vão participar?
R – Teremos sensivelmente os mesmos da última edição, cerca de 90 no recinto da feira e 50 no pavilhão. É a capacidade máxima que temos e rejeitámos vários pedidos de participação. Tal como nas últimas edições, a Feira de São Bartolomeu é uma organização conjunta do município com a Associação Empresarial do Nordeste da Beira (AENEBEIRA). É uma aposta que tem corrido bem, sendo que a parte do cartaz musical é competência da Câmara e a dos stands e dos contactos com as empresas cabe à AENEBEIRA. A Spormex foi a empresa que ganhou o concurso promovido pela associação para a instalação dos stands e tendas.

P – Com o cartaz de espetáculos deste ano acredita que vai ser possível ultrapassar o número de visitantes do ano transato?
R – Não tenho dúvida que, com a Mariza, David Carreira, Paulo Gonzo, os Calema, Olavo Bilac, os Expensive Soul e o festival de folclore, a média de espetadores por noite seja da ordem das seis a sete mil pessoas. Mas também esperamos ter noites com dez mil ou mais entradas, nomeadamente com a Mariza e o David Carreira. Os bilhetes para estes concertos têm um preço simbólico de 2,5 euros, enquanto a entrada para ver Mariza custará 3 euros. Nas restantes três noites a entrada é grátis. São nove noites em que entrarão no recinto mais de 70 mil pessoas, aos quais teremos que somar os visitantes durante o dia, sobretudo às sextas-feiras, pelo que não tenho dúvidas que ultrapassaremos sempre os 100 mil visitantes.

P – A organização não receia a concorrência da Feira de São Mateus, que cada vez começa mais cedo?
R – Será ao contrário, provavelmente (risos). Temos este calendário e não o alteraremos porque quando se mexe muito num evento isso pode trazer consequências piores. Este ano até convidámos o Presidente da República – que não tem disponibilidade de agenda, mas esperamos que possa vir durante o certame –, porque, em 2017, esteve na abertura da Feira de São Mateus, em Viseu, e seria uma honra muito grande que o professor Marcelo Rebelo de Sousa viesse visitar esta que é a feira franca mais antiga de Portugal.

P – Qual é o orçamento desta edição?
R – Este ano foi feito um concurso público por 165 mil euros para os espetáculos, à exceção do concerto da Mariza, mas andará à volta dos 180 a 200 mil euros. É um investimento significativo para a Câmara, mas há uma receita também significativa com a bilheteira. Além disso, há também que ter em conta que a feira decorre muito próximo do centro histórico e que gera retorno na economia local porque todos os restaurantes, cafés, pastelarias e alojamentos turísticos esgotam durante os dias do certame. Portanto, é mais um evento que promove, divulga, Trancoso e é de grande importância para a economia local.

P – E acredita que a feira também contribuiu, de alguma maneira, para o crescimento de turistas registado em Trancoso nos últimos anos?
R – É também um evento fundamental para promover Trancoso, mas há muitos mais que a Câmara organiza, sempre com custos controlados, ao longo do ano. Temos a Feira do Fumeiro, o 25 de Abril, os concertos de Páscoa, a recriação das Bodas Reais, o festival de Música no Castelo, a Feira da Castanha. Este ano acolhemos também a gala final do Concurso de Vinhos da Beira Interior, no passado dia 6 de julho, no castelo. Depois temos a feira semanal, que é das maiores da região. Portanto, motivos não faltam para as pessoas virem a Trancoso, que possui ainda um riquíssimo património histórico e cultural. Quem nos visita leva daqui boas recordações e ficará sempre com vontade de voltar.

P – Mas o município tem indicadores do número de turistas que passam por Trancoso?
R – Temos monitorizados todos esses números, nomeadamente no posto de turismo, no castelo, no Centro Isaac Cardoso e na Casa do Bandarra. São dados muito encorajadores, porque temos sempre 1.300 a 1.400 pessoas por mês que visitam a Casa Bandarra, que abriu há dois anos, e o Centro Isaac Cardoso, que dotámos recentemente de novos conteúdos. A esse número temos ainda que adicionar as visitas guiadas e organizadas. Esta tendência de crescimento exponencial também tem sido confirmada no castelo. Hoje é muito fácil vir a Trancoso e isso também ajuda, daí que tenha sido, de 2016 para 2017, o concelho da área geográfica da CIM Beiras e Serra da Estrela que mais dormidas turísticas registou, com um aumento de 38,3 por cento. Ainda não temos dados de 2018, mas não tenho dúvida que esse crescimento foi ainda maior e está a ser também este ano. Tudo isso se reflete nos serviços que temos. Só na sede do concelho temos seis bancos e dois em Vila Franca das Naves. Que outros concelhos pequenos do interior terão oito instituições bancárias? É um indicador, como também em termos de farmácias, pois temos três na sede do concelho, uma em Vila Franca das Naves e um posto de atendimento no Reboleiro. Isto é fruto da dinâmica de Trancoso, que tem quatro sessões de cinema por semana, nenhum serviço público encerrou, pelo contrário, ainda criámos em Vila Franca das Naves um Espaço do Cidadão. A Escola Profissional está a crescer significativamente e outro indicador de que estamos no bom caminho é a conclusão de um estudo da Ordem dos Economistas, publicado a 7 de maio, segundo o qual Trancoso era o 72º município do país, entre 308 autarquias, em termos de sustentabilidade financeira e o primeiro da área da CIMBSE. São referências que nos elevam a autoestima e nos dão ânimo para continuar a trabalhar pelos trancosenses e em colaboração com as empresas, as Juntas de Freguesia, as associações e as IPSS.

P – Como está a situação financeira do município?
R – A situação financeira ainda é complicada, o que nos obriga a ir muito devagarinho naquilo que pretendíamos realizar no concelho. Será assim durante algumas décadas porque a herança foi muito pesada…

P – Não está a ser alarmista ao dizer isso?
R – Não. Já resolvemos muitas situações, mas continuam a surgir novas ações. Desde 2017 estamos a pagar, só a um empreiteiro, 25 mil euros por mês, ou seja, 300 mil euros por ano em 2017, 2018 e 2019, mais cinco meses em 2020. São obras de saneamentos e arruamentos realizadas em 2007 e 2008. Esta é só uma das muitas ações que foram intentadas contra a Câmara de Trancoso em 2015 e 2016 relativas a obras executadas nos mandatos anteriores e que este executivo está a pagar. Teremos agora que chegar a acordo relativamente a outras empreitadas realizadas no Sintrão, em Castaíde e na Póvoa do Concelho, são 460 mil euros reclamados pelo empreiteiro, com quem teremos que chegar a acordo para pagarmos de forma faseada. Outras ações foram contestadas, fomos absolvidos nalgumas, felizmente, noutras temos que pagar porque as obras foram executadas, sem concurso, mas a situação hoje já é substancialmente melhor. Já temos alguma folga financeira para fazer alguns investimentos.

P – Qual é neste momento o valor da dívida?
R –A dívida registada será de cerca de 4 milhões de euros no final do ano, relativos a empréstimos de médio e longo prazo, que já vinham de trás. Teremos cerca de 1,5 milhões de euros em ações judiciais contra o município e falta ainda resolver o caso da parceria público-privada PACETEG, que surge nos resultados da auditoria à CGD com 2 milhões de imparidades. Neste caso há 9 milhões de euros que estão agora em discussão, nós queremos pagar, mas não esse valor porque temos uma avaliação das três obras realizadas (campo da feira, central de camionagem e Centro Cultural Miguel Madeira) que aponta para 4,6 milhões de euros. É esta a nossa situação financeira, que no dia-a-dia ainda é muito pesada. Só estes encargos de 450 mil euros para pagar a dois empreiteiros em 2019 davam para fazer muitas obras ou apoiar mais as Juntas de Freguesia e as associações.

P – E quando chegou à Câmara, em 2013?
R – Tínhamos cerca de 11,5 milhões de euros de dívida registada a bancos e a terceiros, mais três ou quatro milhões das ações judiciais e os nove milhões da PACETEG, o que perfazia um total da ordem dos 24 milhões de euros. Atualmente a situação é controlável, temos um prazo médio de pagamento de cerca de 30 dias, quando era de 309 dias na altura, e não temos pagamentos em atraso. É uma questão de mais mandato, menos mandato, para o município ficar numa situação desafogada.

P – E é um objetivo dos seus mandatos deixar a Câmara numa situação financeira equilibrada?
R – Sim, mas essas ações da parceria público-privada representam 9 milhões de euros, o que é muito para uma Câmara cuja conta de gerência ronda os 10,5 milhões por ano. Não é num mandato ou dois que conseguimos amortizar todas estas situações, mas o objetivo principal é equilibrar as contas e, ao mesmo tempo, continuar a colocar Trancoso no rumo certo e, isso, creio que conseguimos nestes últimos anos. Hoje, a marca de Trancoso está em grande, são muitas as pessoas que nos visitam e os empresários querem investir. Será assim, não tenho dúvida, com a nova área empresarial (ver texto na página 4).

P – Está tudo pronto para o arranque do ano letivo no Centro Escolar da Ribeirinha. Não foi uma aposta arriscada, numa altura em que a população escolar está a baixar, sobretudo no interior?
R – Este é um exemplo de que a Câmara se preocupa também com as freguesias e o mundo rural porque são extremamente importantes para a sede do concelho. Já inaugurámos o lagar de azeite de Freches, na Cogula houve também um investimento significativo num arranjo urbanístico, em Moreira de Rei decorrem obras na Igreja de Santa Marinha e na envolvente, no âmbito das quais foi descoberta possivelmente a maior necrópole da Península Ibérica, com cerca de 500 sepulturas antropomórficas e construímos o Centro Escolar da Ribeirinha em Palhais. Em breve iremos criar um parque de caravanismo em Valdujo cujo projeto foi já aprovado e apresentado pela Junta de Freguesia. No caso do Centro Escolar, creio que foi uma aposta certa porque não podíamos permitir que os alunos do pré-escolar e do primeiro ciclo que moram naquela freguesia e nas vizinhas, ainda longe da sede do concelho, tivessem que percorrer diariamente, em autocarro, 20 ou mais quilómetros para frequentar a escola em Trancoso e depois regressar a casa, usando estradas perigosas, sobretudo no Inverno. Obviamente que queremos uma escola de sucesso e de proximidade, pelo que esses 25 a 30 alunos vão ter ali as melhores condições para estudar.

P – Em termos de acessibilidades, defendeu recentemente a conclusão do IC26, entre o IP2 e A24. O que ganhará Trancoso com essa ligação?
R – Trancoso tem uma localização geográfica excelente, para aqui confluem vários eixos rodoviários importantes, caso da antiga EN 122, vinda de Foz Côa, da EN 226, desde Lamego, da estrada municipal da Mêda e depois a sul, com o IP2, que tem o perfil de autoestrada até à A25. Esse IC26, a ser construído entre Lamego, Moimenta da Beira e Trancoso, daria maior centralidade à nossa cidade e ao concelho. Muitas das pessoas que nos visitam e vêm sobretudo ao nosso mercado semanal são oriundos dessa zona, pelo que seria uma forma de atrair mais gente.

P – Entretanto, a Câmara vai iniciar a segunda fase da requalificação da EN226 dentro da cidade. Porque se optou por essa intervenção?
R – Em termos de repavimentações a Câmara tem seguido sempre esta estratégia: todos os anos repavimentamos cerca de meia dúzia de quilómetros de estradas. Sabemos que são obras caras, a autarquia não pode ir mais além, mas há estradas municipais que queremos intervencionar, caso dos ramais de Guilheiro e das Torres, que serão repavimentadas em breve. Há ainda uma ou outra ligação, quer a Souto Maior, aos Moinhos das Cebolas, ao IP2 e às Moitas que importantes e necessárias, o problema é que o dinheiro não chega para tudo. A obra na estrada que passa pela cidade, entre a rotunda do Minipreço, na Avenida Heróis de São Marcos, e a Lactovil, é uma das que já não conseguíamos adiar porque a estrada fica completamente partida, sobretudo no Inverno, e é até muito difícil fazermos a sua manutenção. Os trabalhos vão arrancar imediatamente a seguir à Feira de São Bartolomeu, ou seja, no dia 19. A empreitada foi adjudicada e consignada há dois meses, mas, por opção da Câmara e do empreiteiro, foi decidido adiar o seu início porque estamos numa época de muito movimento e esta é a principal via de acesso e de passagem por Trancoso. A obra tem um custo de 450 mil euros e foi adjudicada à empresa João Tomé Saraiva.

P – O que vai ser feito?
R – Além da melhoria do tapete, serão também intervencionados os passeios com alguns arranjos urbanísticos junto ao Largo da Feira e em frente ao estacionamento do mercado. Serão ainda instaladas condutas novas de águas pluviais e depois vai ser colocada sinalética atualizada. Esperamos que esta obra esteja concluída antes do Inverno, em fins de outubro. O objetivo é ter tudo pronto na próxima Feira da Castanha, a 1, 2 e 3 de novembro, pois é uma empreitada que vai dar um aspeto completamente diferente a Trancoso e, acima de tudo, proporcionará mais segurança aos automobilistas e aos peões.

P – As sardinhas doces são o novo ex-libris de Trancoso. Acha que é possível chegar à final do concurso “7 Maravilhas”?
R – O concurso foi uma ideia feliz da RTP e creio que aquele dia 10 de julho foi importantíssimo para o distrito porque Vila Nova de Foz Côa, Pinhel, Seia, Guarda, Trancoso e Figueira de Castelo Rodrigo tiveram a oportunidade de mostrar as coisas boas que ali se fazem. Creio que qualquer um desses doces que tivesse passado à fase final nacional representaria bem o distrito, mas obviamente que ficámos contentes e muito satisfeitos por terem sido vencedoras as sardinhas doces de Trancoso. Este concurso serviu também para mobilizar e unir os trancosenses. Foi bonita a forma como dos mais pequenos – muitos deles, se calhar, nunca tinham ouvido falar das sardinhas doces – aos mais velhos, dos residentes aos que estão fora do concelho e também aqueles que apreciam este doce conventual do século XVIII, todos se uniram e estamos confiantes num bom desfecho. Por isso, iremos também aproveitar esta edição da Feira de São Bartolomeu para continuar a promover as sardinhas doces. Atualmente, temos cerca de seis ou sete senhoras que confecionam de forma artesanal e com a qualidade que essa iguaria exige e que também as colocam à venda em cafés e restaurantes da cidade. Há igualmente duas pastelarias que as produzem de forma artesanal e depois a Casa da Prisca, que tem sido importante na divulgação deste doce tradicional de Trancoso. São estes protagonistas que queremos reunir no pavilhão multiusos para continuar a divulgar o número de telefone para votar nas sardinhas doces porque a linha deve reabrir no dia 21 de agosto.

P – Acha que o concurso é o impulso que faltava para as sardinhas doces terem mais notoriedade?
R – Sim, também é. Notamos que desde 10 de julho muitas pessoas vêm a Trancoso e procuram as sardinhas doces, que esgotam a meio da manhã. Felizmente que a Casa da Prisca produz em grandes quantidades, mas estou convencido que vai ser mais um motivo de atração e de trazer gente à cidade. O Fundão tem a cereja, mas nós vamos ter as sardinhas doces, que acredito será mais fácil certificar este doce como Especialidade Tradicional Garantida (ETG) se vierem a ser consideradas uma das “7 Maravilhas Doces de Portugal”.

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