Operação Carnaval

Escrito por António Ferreira

Os últimos anos foram pródigos em atividade nas ruas e praças da Guarda. É raro o mês em que não aconteça alguma coisa, desde a Feira Farta às Noites Brancas, à Cidade Natal, à Feira Ibérica de Turismo, aos Santos Populares, ao Carnaval. A lógica interna desses eventos é a mesma da antiga Roma, em que os imperadores aplacavam a inquietude da plebe com pão e circo. Hoje, tão pouca é a inquietude que parece bastar o circo. Nas caixas de comentários das redes sociais, os apaniguados (o uso da palavra não é inocente) vão dizendo que pelo menos agora há movimento, que a Guarda está no mapa, que acontecem coisas. Deveríamos discutir as coisas que acontecem, por comparação ao que deveria acontecer, e podíamos discutir o que fica depois de cada festa, fora o lixo nas ruas e a despesa feita.
Falemos mesmo assim de despesa e do que custou o Carnaval de 2014, nome de código “Guarda Folia”. Em fevereiro de 2014, em conferência de imprensa no café concerto, o presidente da Câmara anunciava que o evento iria custar 51.000 euros, seria financiado a 85% com fundos comunitários e que uma empresa ou instituição se encarregaria das ações de Carnaval. No programa estava, para além de outros acontecimentos, o habitual “Julgamento do Galo”, agora na Praça Velha. Até aqui tudo normal, tudo como em tantas outras festas e eventos: crise e austeridade no país, foguetes na Guarda.
O problema é que, sabe-se agora, esse Carnaval de 2014 levou a que boa parte do executivo camarário, incluído o presidente, esteja a braços com uma acusação de fraude para obtenção de fundos comunitários. O esquema, segundo foi divulgado agora, passaria pela obtenção de financiamento comunitário através da cooperativa Teatro Aquilo, e a fraude residiria em que esse financiamento não serviria para as atividades da cooperativa, mas sim para as que a Câmara organizou no Carnaval de 2014. Quem quiser ver o programa do Carnaval de 2014 não vai encontrar em lado nenhum, em nenhum dos eventos, o nome da cooperativa Teatro Aquilo, nem como organizadora, nem como financiadora, nem sequer como parceira ou apoiante. A ser assim, é grave. As sanções são pesadas e podem envolver penas de prisão efetiva para quem praticou os factos. Para a cooperativa, se também foi constituída arguida e for condenada, pode estar em causa a sua dissolução e, no mínimo, ficar temporariamente impedida de receber financiamentos públicos.
É urgente que os envolvidos deem explicações, seja a cooperativa Aquilo, seja o município. De preferência, ambos. Não é bom que se escudem no velho chavão de que “há que aguardar pelas decisões dos tribunais” quando uma das mais prestigiadas coletividades da cidade está em perigo e mais uma vez, pelos piores motivos, a Guarda volta a ser notícia.

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António Ferreira

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