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TMG é um pesadelo para Carlos Veloso há 15 anos

Arquiteto que desenhou Teatro Municipal da Guarda não consegue cobrar honorários devidos pela autoria do projeto. Atualmente, Carlos Veloso reclama 500 mil euros, mas a autarquia considera que só tem a pagar 190 mil euros. O diferendo vai ser julgado num tribunal arbitral.

O Teatro Municipal da Guarda (TMG) comemora dez anos no sábado, mas o arquiteto que o desenhou tem poucos motivos para festejar. Há 15 anos que vive um verdadeiro calvário porque a Câmara não lhe pagou ainda os honorários decorrentes do projeto e obrigatórios por lei. O guardense Carlos Veloso tinha 28 anos quando ganhou o concurso para a conceção do complexo cultural da cidade mais alta, hoje, admite que esse trabalho destruiu a sua carreira.

«Desde que fiz o TMG só tive prejuízo, nunca consegui desfazer-me das dívidas. Há sempre alguma coisa “pendurada”, tem-me consumido tempo, dinheiro e saúde», confessa o arquiteto. Agora com 44 anos, Carlos Veloso faz contas à vida e reclama 500 mil euros, já a autarquia considera que só tem a pagar 190 mil euros. O diferendo continua insanável após a intermediação falhada da Ordem dos Arquitetos e de um tribunal ad-hoc – em que a Câmara terá gasto 10 mil euros sem qualquer resultado prático –, tendo sido transferido para outra instância em 2010. O litígio já está na fase de julgamento no tribunal arbitral das profissões liberais onde o arquiteto pede o ajuste de honorários. «Passaram quatro mandatos e o problema continua por resolver», lamenta Carlos Veloso, adiantando que a Câmara liquidou cerca de 200 mil euros. Os honorários devidos por todos os projetos elaborados na conceção do TMG resultam da aprovação das estimativas e orçamentos pela Câmara da Guarda, então presidida por Maria do Carmo Borges.

Segundo o arquiteto, a diferença de valores resulta de «uma leitura errada» do cálculo dos honorários, pois os técnicos camarários da altura consideraram que a verba obtida, tendo em conta o preço da adjudicação da empreitada (800 mil contos, valor que evitou um concurso público internacional), era para o projeto de arquitetura, especialidades e estruturas. «A portaria que rege estes casos é clara e estabelece que deve ser tido em conta as diferentes fases do projeto e os honorários dos engenheiros, por isso, o cálculo inicial está mal porque o valor proposto pela Câmara só cobriu o projeto de arquitetura», explica Carlos Veloso. Pior, devido a alterações pedidas pela autarquia, o projeto foi reformulado e a obra passou a custar 1,2 milhões de contos, o que implicava que os honorários tivessem também que ser atualizados. Contudo, a obra começou e não houve qualquer pagamento, nem correção dos valores.

Para tentar cobrar algum, o arquiteto ainda propôs «um desconto de 30 por cento sobre o valor de lançamento da empreitada», mas nem assim. «A obra começou sem isto estar resolvido e apesar da minha insistência para se fazer o ajustamento de acordo com o novo preço», lamenta Carlos Veloso, para quem esta situação deve-se ao facto do TMG ter sido «o primeiro processo com conceção realizado pela Câmara e os seus serviços técnicos não estavam habituados a isso». De resto, considera que nessa altura «havia “quintais”» no departamento de obras da autarquia. Entretanto, o arquiteto teve que pagar do seu bolso aos projetistas, sendo que um engenheiro eletrotécnico colocou o seu escritório em tribunal que condenou Carlos Veloso ao pagamento de 120 mil euros. «Até à data, a Câmara tem arranjado sempre formas de não assumir o pagamento dos devidos honorários pelo trabalho realizado», critica o arquiteto, que diz ter gasto cerca de 22 mil euros só de custas judiciais com este problema.

Dez anos depois da sua abertura, o TMG ainda não tem licença de exploração emitida pela Direção Regional de Economia do Centro. «Há apenas uma provisória porque a Câmara não consegue apresentar o projeto eletrotécnico dos edifícios por falta de pagamento dos honorários devidos ao respetivo engenheiro da especialidade», declara. O INTERIOR tentou contactar o presidente do município Álvaro Amaro a propósito deste caso, mas tal não foi possível até ao fecho desta edição.

Câmara assume dívida, mas de 184.213 euros

Os honorários de obras públicas são calculados de acordo com as “Instruções para o Cálculo de Honorários de Projectos de Obras Públicas” a que se refere a Portaria de 7 de fevereiro de 1972 do Ministro das Obras Públicas e das Comunicações, publicada no “Diário do Governo” a 11 de fevereiro desse ano, com as alterações de atualização constantes da Portaria publicada no “Diário da República” de 5 de março de 1986, e a vigorar na altura da celebração do contrato e mencionada no mesmo. No diferendo com Carlos Veloso a autarquia tem protelado sucessivamente o pagamento dos honorários apesar de ter assumido uma dívida para com o arquiteto. Prova disso está numa informação dos serviços do município datada de 19 de setembro de 2011, onde o engenheiro António Patrício e o arquiteto Vítor Gama teorizam sobre a forma de cálculo de honorários e fixam um valor de dívida de 184.213,50 euros. Este foi o documento que serviu para justificar em sede de tribunal arbitral, já numa fase de acordo eminente, o valor que a Câmara estava disposta a acordar.

TMG custou mais de 16 milhões de euros

O custo final do TMG terá ultrapassado os 16,1 milhões de euros, de acordo com dados a que O INTERIOR teve acesso.

A construção dos edifícios custou mais de 9 milhões de euros, enquanto o trabalho de fundações e estruturas ficou em 3.458.905,13 euros. O estudo acústico e equipamentos foi a terceira parte da obra mais cara, tendo custado 798.534,48 euros, seguindo-se os trabalhos relativos a instalações e equipamentos mecânicos (665.138,52 euros), o mobiliário (414.004,75 euros), a rede de instalações e equipamentos elétricos (351.653,24 euros) e os arranjos exteriores (255.732,92 euros). Estes são alguns dos custos desta empreitada, aos quais se somam os 700 mil euros de honorários do arquiteto autor do projeto. Destes, apenas foram pagos 200 mil euros.

O TMG foi inaugurado em abril de 2005 e é constituído por dois cubos gigantes numa área de 11 mil metros quadrados. Num deles está localizado o grande auditório com capacidade para mais de 626 pessoas e também o pequeno auditório com 164 lugares. O outro bloco acolhe o café-concerto com capacidade para 100 pessoas, uma galeria de arte e um estacionamento subterrâneo de três pisos. Na cerimónia inaugural, o então presidente da Câmara Álvaro Guerreiro adiantou aos jornalistas, que o empreendimento representava um investimento aproximado de 10,5 milhões de euros, tendo a obra registado «trabalhos a mais na ordem dos 13 por cento».

Luis Martins Dez anos depois da sua abertura, o TMG ainda não tem licença de exploração emitida pela Direção Regional de Economia do Centro

Comentários dos nossos leitores
Nvc nobreceleste @hotmail.com
Comentário:
Grande negócio , tanto para o construtor como para o arquitecto. Projectos com este valor ,só para os protegidos !!!!!!!!!
 

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