Liga-se a televisão, é a hora do telejornal e os castelos de areia aparecem como notícia de destaque; abrem-se os jornais e lê-se em letras bem gordas ” o mar volta a destruir os castelos de areia que o homem construiu”, “as chuvas torrenciais provocam elevados prejuízos nos castelos de areia”, “os rios galgaram as margens destruindo todos os castelos de areia que encontraram”, “os incêndios destruíram uma grande percentagem dos castelos de areia e causaram o pânico em inúmeros locais do país”. Ouvimos e lemos repetidamente estas noticias, como se de um ciclo vicioso se tratasse, encarando-as com uma normalidade gélida e despreocupada.
Quantas vezes iremos reconstruir pontões, obstruir o leito dos rios, construir e reconstruir em leito de cheia ou adulterar a paisagem policultural?
Quantos milhões terão de ser ainda gastos para tomarmos consciência e rasgar-mos a venda que insistimos em trazer?
Porque será que quando sofremos as consequências dos nossos próprios actos apenas conseguimos ver vidas ameaçadas, lares destruídos ou o dinheiro queimado e não o nosso acto cansativamente repetido, hipócrita e ganancioso?
Quantos planos de ordenamento, estudos de impacto ou legislações serão necessários para construir uma consciência ambiental?
Quantos especialistas serão necessários para demonstrar que o sistema dunar é ecologicamente mutável e com tendência a avançar cada vez mais para terra não parando ou estagnando onde o homem coloca um sinal de “stop”?
Quantos estudos terão de explicar que ao impermeabilizar, regularizar e obstruir o leito do rio, ao destruir as cabeceiras de linha de água e ao construir em leito de cheia aumentamos sim a probabilidade de acontecimentos catastróficos como os que acorreram á bem pouco tempo?
Quantas florestas conseguiram resistir ao aumento do sistema monocultural e ao contínuo abandono e consequente falta de limpeza?
Quantos castelos de areia ainda queremos construir para termos a certeza de que a areia seca, o vento sopra e ao fim só o silêncio angustiante permanece?
Por: Carla Madeira *
* Arquitecta Paisagista, na Guarda, inicia nesta edição colaboração mensal